O mercado de capitais brasileiro viveu nos primeiros seis meses de 2025 um momento de expectativa renovada para as ofertas públicas iniciais (IPOs). Após quase três anos de paralisação, analistas, bancos e investidores voltaram seus olhos para a B3 na busca por novas oportunidades de captação e diversificação. Neste artigo, exploramos o contexto histórico, as principais movimentações, dados de desempenho e os fatores que podem impulsionar ou frear essa retomada.
Desde setembro de 2021, quando a Vittia foi a última empresa a abrir capital, o mercado brasileiro enfrentou uma seca histórica de IPOs. O principal vilão desse período prolongado foram as altas taxas de juros, que superaram a casa dos dois dígitos e desestimularam as companhias a buscar recursos na bolsa. Com o custo de capital elevado, projetos de expansão e investimento ficaram restritos ao financiamento bancário ou recorrência a investidores privados.
O patamar da Selic rondando 13,75% em meados de 2022 e 2023 criou um ambiente em que a emissão de ações parecia pouco atraente. Enquanto isso, os investidores migraram recursos para a renda fixa, em busca de retornos garantidos e de baixo risco. Essa migração, unida à aversão global ao risco em função de incertezas econômicas, fechou uma janela que, até então, se mantinha ativa de forma regular.
No primeiro semestre de 2025, o humor do mercado começou a mudar. A projeção de queda gradual nos juros, nacional e internacionalmente, reacendeu o debate sobre o retorno das ofertas. O Boletim Focus indicou expectativa de Selic em 10% ao final do ano, número ainda elevado, mas suficiente para despertar interesse de empresas em retomar processos de abertura de capital.
Bancos de investimento intensificaram reuniões com potenciais emissores, preparando roadshows e due diligences para acelerar projetos. O apetite estrangeiro, considerado essencial, voltou a ser testado em estandes de conferências e pitch decks. Se confirmada a tendência de queda dos juros globais — especialmente nos Estados Unidos — o Brasil poderá se beneficiar de um duplo movimento: redução de custo interno e maior liquidez externa.
Embora ainda não tenha ocorrido nenhum IPO concreto no semestre, o mercado identificou diversas candidatas. Critérios como governança corporativa robusta, histórico de lucro e atuação em setores estratégicos tornaram certas empresas mais propensas a buscar capital na B3. Entre os nomes especulados, destacam-se startups de tecnologia, empresas de educação e redes de varejo.
Paralelamente, a lista de BDRs elegíveis ao Ibovespa B3 BR+ cresceu em maio de 2025. Entre os principais estão Afya, Inter&Co, Mercado Livre, Nubank, PagSeguro, StoneCo, VTEX e XP Inc. Essa movimentação demonstra o interesse em diversificar portfólios e ganhar exposição a grandes empresas, mesmo sediadas no exterior.
O semestre foi marcado por forte valorização do Ibovespa, que acumulou 15,44% de alta, atingindo o melhor resultado em quase uma década. Esse desempenho foi alavancado por papéis de empresas que se destacaram por resultados consistentes e perspectivas de crescimento.
Além disso, o ingresso de capital estrangeiro recorde desde 2022 renovou a confiança na B3. Fundos de pensão internacionais e gestores de ativos aumentaram posições em ações brasileiras, apostando no cenário de juros mais baixos e na retomada econômica do país.
Apesar do otimismo, alguns obstáculos ainda rondam a retomada dos IPOs. As incertezas fiscais internas e a volatilidade nos mercados globais podem adiar decisões. Para muitos analistas, só haverá ritmo significativo de ofertas quando a Selic estiver consistentemente abaixo de 10% e o ambiente político oferecer maior estabilidade.
Por outro lado, um movimento coordenado de cortes de juros nos EUA e Europa pode desencadear um fluxo mais robusto de capital para emergentes, beneficiando o Brasil. Nesse caso, grandes companhias com forte governança e apelo internacional estariam prontas para aproveitar a janela de oportunidade.
No exterior, fintechs como Klarna e Revolut preparam IPOS bilionários, enquanto o Nubank, já listado nos EUA, valorizou 45% em 2024. Esses cases servem de parâmetro para o mercado brasileiro e reforçam a tese de que empresas inovadoras com grande base de usuários podem atrair fluxo expressivo de capitais.
Os exemplos internacionais indicam que o sucesso de uma oferta depende não apenas do cenário econômico, mas também da capacidade de contar uma história de crescimento e inovação. No Brasil, companhias que souberem evidenciar seu diferencial competitivo e governança terão maior chance de sucesso.
Enquanto as ofertas públicas não se materializam, investidores mais sofisticados vêm buscando alternativas. Os BDRs permitem acesso a grandes empresas globais, reduzindo a dependência das mudanças na Selic. Fundos de ações setoriais e fundos de private equity também ganharam espaço, oferecendo diversificação e potencial de retorno acima da renda fixa.
Essa diversificação de instrumentos mostra a maturidade crescente dos investidores locais e aponta para um mercado mais rico e resiliente, capaz de absorver oscilações e aproveitar oportunidades mesmo em cenários desafiadores.
A B3 chega ao segundo semestre de 2025 em um ponto de inflexão. O fim da seca de IPOs parece próximo, condicionado à trajetória de juros e à confiança do investidor. Em um cenário otimista, ainda é possível ver lançamentos relevantes ainda em 2025; de forma mais conservadora, o grosso das ofertas pode ficar para 2026.
O movimento que se desenha reforça a importância de combinar fortes fundamentos econômicos, governança sólida e narrativa clara de crescimento. Empresas que reunirem esses elementos estarão à frente na corrida por capital, contribuindo para a diversificação e o amadurecimento do mercado de capitais brasileiro.
Referências